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Ontem eu fiz a barba pela primeira vez…

Alguns momentos da vida de uma pessoa são indescritíveis. Alguns momentos na vida de um homem são inesquecíveis. Mesmo que para aqueles que ainda nem sabem que já o são.
Talvez para uma criança o maior desejo seja brincar, o melhor momento seja o das brincadeiras e o que mais queira é não ter responsabilidades e continuar sendo inocente. Talvez, para um adolescente o desejo seja deixar de ser criança, é imaginar-se jovem e com atitudes, o que mais queira é não ser tratado como criança e imaginar-se adulto. Talvez para um jovem o desejo seja conduzir sua própria vida, sem interferência, ser independente e responsável pelos seus próprios atos.

Independente daquilo que os novos tempos definam como sexualidade, na maior parte de qualquer sociedade para uma menina, garota, ou mulher existirão sempre sinais que refletirão e serão simbólicos de cada fase: as fitinhas no cabelo, as cores de roupas mais leves e de tons pastel, as brincadeiras com bonecas e casinhas, a aula de balé, o uso do batom e cosméticos, o jeito delicado de ser, o absorvente.
Para o menino, garoto, ou homem sempre haverá a presença de símbolos que exijam a prova de sua virilidade. As fantasias de tecido e emocionais de heróis com poderes infindáveis e sobrenaturais, o uniforme de futebol, a paixão por lutas de todos os tipos, o desejo de querer dominar e nunca ser dominado, o querer ser caçador e nunca caça, a barba que cresce no rosto, a camisinha. Lembro, como se fosse ontem, do dia em que percebi, e com muito orgulho, os primeiros e escassos pelos em meu rosto. Lembro que olhava para meus amigos, já via neles estes sinais e ansiava, também, pela minha “penugem”. Lembro-me do “bulling” sofrido, enquanto, atrasado, permanecia como adolescente.
Faz muito tempo, mas lembro, como qualquer homem lembrará para sempre deste momento, porque marca um momento de autoafirmação, de mudança de rotinas e comportamentos, de percepção, perante o seu grupo social, família e familiares. O momento em que um homem, em sua solidão, mas acompanhado sempre de seu reflexo, a cada novo dia, decidirá por ter a face higienizada, limpa e lisa, ou não. Esta decisão será sempre, intima e, exclusivamente, sua.
Ontem, somente e a partir de ontem, após decorridos mais de 90 anos de sua vida, cansado e fragilizado pelo próprio tempo que debilita seu corpo, por doenças e somatizações infindáveis, pela perda recente da parceira, amante e esposa por mais de 50 anos, meu pai não fez a sua barba…fui eu, e, vou guardar em minha memória para sempre, que tive a alegria, o prazer, emoção e honra de assim poder imaginar, pensar, descrever e agora eternizar de forma escrita tal momento.

Valmir Basso – v.basso@ig.com.br